A senzala da dança do samba

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Por Gabriel Castro

Foto: Arquivo Pessoal

“Qual é a posição do passista hoje?”

Sempre me pergunto isso todos os anos desde quando cheguei ao segmento, lá se vão 15 anos. A resposta naquela época era simples, o fundo de quadra e tapar buraco no desfile oficial. Mas isso mudou, somos peça principal nos palcos do samba e fora dele, a dança brasileira é representada no mundo primeiramente por nós passistas, o jogo virou e posso provar…

Recebi essa divulgação, um encontro na semana da dança organizado pelo Sindicato de Dança do Rio de Janeiro, que se dispõe em realizar uma roda de conversa sobre o mercado de trabalho da dança no carnaval. Conta com convidados de gabarito e qualidade inegável em suas áreas de atuação, ideia incrível, carnavalescos, coreógrafos de comissões de frente e casais de Mestre-sala e Porta-bandeira, porém não entendi a falta de representantes da dança do samba, o PASSISTA. Ou entendi, o que é pior.

Talvez não seja o caso, ou talvez seja. O fato é que desde sempre a dança originária do samba é vista como menor e/ou inferior em relação a outra. O profissional que a exerce em plenitude tem mais reconhecimento do público e oportunidades de trabalho fora do Brasil do que aqui em nosso próprio país. O que é surreal ser imaginado, sua cultura e sua arte ser mais valorizada por um mercado consumidor estrangeiro. Professores de samba no pé lotam salas, congressos e workshops de dança pelo mundo inteiro. No próximo verão do hemisfério norte, mais especificamente na Europa e América do Norte, colegas farão turnês de mais de um mês por vários países. Dançarinos de samba são exportados a todo momento para shows em todo o mundo, gente de todos os estados da federação e não somente do Rio de Janeiro. Ganhamos terreno a passos largos, somos tema principal de um eventos reconhecidos mundialmente de dança do samba (Brasil Samba Congress, Eu Sambo Assim – International e outros) com ramificações em outros continentes e dentro de nossa própria casa somos desvalorizados, a chave ainda não virou. Hoje o passista de ofício já assume inclusive papéis que sempre lhe foram negados, somos o show principal, o ápice das apresentações, o momento mais esperado pelo público.

Hoje o passista monta coreografia de seu segmento, por vezes alguns diretores de passistas são os responsáveis pela montagem dos shows das agremiações. Inclusive alguns colegas e o próprio autor que aqui escreve já fazem inclusive comissões de frente, conseguindo notas e galgando lugares que sempre lhe foram negados.

A velha oligarquia da dança no Brasil e seus sindicatos permanece colocando a dança do samba e as danças populares como inferiores, jogam tudo em um mesmo balaio de gatos e chamam a rica cultura popular de danças brasileiras como “Dança Show” quando o dançarino precisa se sindicalizar para algum trabalho.

Está mais do que na hora dessa mesa ser virada, o jogo mudou e a dança do samba sempre vista como menor é moda no mundo. Seus profissionais estão trabalhando e sendo sustentados por ela, fazendo escola e vivendo pela sua arte. O passista é discriminado a todo momento desde sempre e já se acostumou a não subir no palco principal e se subir, somente pra fazer pano de fundo. A dança do samba do passista precisa ser reconhecida como modalidade específica e não genérica pra ontem. Chega ao ponto de ser deselegante e inoportuno pra quem não o faz e não pra nós, pois geramos nossos próprios mecanismos de e métodos de reconhecimento interno com discurso e reconhecimento direto com nosso público consumidor.

CHEGA DE SER CONSIDERADO MENOR,
CHEGA DE SER COADJUVANTE, CHEGA!
AGORA SOMOS ATORES PRINCIPAIS
E NÃO QUEREMOS O QUE SOBRA,
QUEREMOS SER PARTE DO BOLO,
GRAU DE IGUALDADE
COM QUALQUER OUTRO PROFISSIONAL DA DANÇA.
A SENZALA DA DANÇA DO SAMBA ACABOU,
NOS LIBERTAMOS DAS AMARRAS OPRESSORAS,
IGUALDADE JÁ!

“Brasil chegou a vez
De ouvir as Marias, Mahins,
Marieles, Malês…”

1 COMENTÁRIO

  1. Falou tudo!! E o refrão do samba-enredo ja tá prontinho pra cair na boca do povo!!
    “CHEGA DE SER CONSIDERADO MENOR,
    CHEGA DE SER COADJUVANTE, CHEGA!
    AGORA SOMOS ATORES PRINCIPAIS
    E NÃO QUEREMOS O QUE SOBRA,
    QUEREMOS SER PARTE DO BOLO,
    GRAU DE IGUALDADE
    COM QUALQUER OUTRO PROFISSIONAL DA DANÇA.
    A SENZALA DA DANÇA DO SAMBA ACABOU,
    NOS LIBERTAMOS DAS AMARRAS OPRESSORAS,
    IGUALDADE JÁ!

    “Brasil chegou a vez
    De ouvir as Marias, Mahins,
    Marieles, Malês…””

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